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Dr.
Luís Carlos Calil
Alcoolismo
é um dos maiores problemas de saúde publica no
mundo, causa centenas de milhares de óbitos prematuros,
contribui em consideráveis gastos nacionais em saúde
e é responsável por gastos pela perda em produtividade.
O tratamento envolve principalmente a orientação
profissional, que pode incluir tratamento comportamental e psicológico
e/ou participação em programas de auto-ajuda (ex:
Alcoólicos anônimos). A intervenção
farmacológica visa aliviar os sintomas de abstinência
e evitar recaídas.
O
estudo epidemiológico de maior abrangência e confiabilidade,
(entrevista estruturada com 20.291 pessoas da comunidade e institucionalizadas)
estima prevalência da dependência em álcool
na população norte-americana em 13,5% e entre
esses, 37% apresentam comorbidade com outros transtornos mentais:
adição em outras drogas, transtorno de personalidade
anti-social, transtorno de humor e esquizofrenia. Aumentam as
evidências de que interação de fatores biológicos,
psicológicos e sociais estão envolvidos nas causas
do etilismo.
Diagnóstico
Será
utilizada nomenclatura, códigos e critérios da
Classificação Internacional de Doenças
- CID-10 coordenada pela OMS, oficialmente em vigor no Brasil
desde 1993.
O
questionário CAGE é composto pelas quatro seguintes
perguntas e pode ser facilmente incorporado à entrevista
do paciente: Você já (1) pensou em largar a bebida?
(2) ficou aborrecido quando outras pessoas criticaram o seu
hábito de beber? (3) se sentiu mal ou culpado pelo fato
de beber? (4) bebeu pela manhã para ficar mais calmo
ou se livrar de uma ressaca (abrir os olhos?). A presença
de duas respostas afirmativas sugerem uma indicação
positiva de dependência de álcool. Apesar dos problemas
relacionados ao álcool apresentarem um continuum de gravidade,
o teste CAGE é bastante preciso para identificar pacientes
ambulatoriais dependentes de álcool conforme a definição
dos critérios DSM-III-R, a classificação
americana de transtornos mentais.
Os
pacientes mais gravemente acometidos podem ter maior dificuldade
no confronto com o problema. Muitos tentaram parar várias
vezes, porém sem sucesso. Como esses indivíduos
são geralmente muito sensíveis à rejeição,
é importante que os médicos os tratem com a mesma
preocupação que dariam a pacientes com qualquer
doença crônica, que aceitem as recaídas
e encorajem a continuação do tratamento.
Propriedades
do álcool
O
álcool é completamente miscível em água,
cada célula humana está sujeita à sua interação.
No fígado o álcool é oxidado em acetaldeído,
um composto ainda mais tóxico. O álcool possui
valor calórico, mas não nutritivo.
Interações
medicamentosas
A
interação mais importante é o aumento da
depressão do SNC induzida pelo uso concomitante de álcool
e outros compostos de ação semelhante, incluindo
anestésicos gerais e opióides, drogas hipnóticas
e ansiolíticas, anti-histamínicos, agentes antipsicóticos,
relaxantes musculares de ação central, agentes
anticolinérgicos de ação central, antiepilépticos
e certos anti-hipertensivos (reserpina, metildopa, clonidina).
Tolerância
e dependência física
São
resultantes do uso crônico de álcool - a tolerância
parece estar relacionada ao aumento do metabolismo (disposição
da droga) e das alterações adaptativas dos constituintes
neuronais (farmacodinâmica), que servem para neutralizar
os efeitos a curto prazo do álcool.
A
adaptação celular do SNC estabelece conseqüentemente
um estado de dependência física. Essa dependência
se torna aparente quando a redução da ingestão
ou a abstenção do álcool causa desconforto
subjetivo e sinais objetivos de abstinência. Os sintomas
mais precoces e mais comuns de síndrome de abstinência
incluem hiperatividade autonômica e somática (ex:
ansiedade, taquicardia,, hipertensão, arritmias, aumento
do tônus muscular e tremores, náuseas e vômitos),
insônia e um leve estado confusional com irritabilidade
ou agitação. Entre os sintomas pronunciados de
excitação neuronal estão os distúrbios
de percepção (ex: ilusões auditivas ou
visuais, alucinações) e hiperreflexia; uma pequena
porcentagem de pacientes apresenta uma ou mais convulsões
tônico-clônicas. A manifestação mais
grave da abstinência do álcool é o delirium
tremens, um estado confusional severo caracterizado por profunda
agitação, delírio, hiperatividade autonômica
grave, hiperpirexia, tremores e convulsões.
Tratamento
Não
serão exploradas abordagens psicoterápicas ou
terapias farmacológicas aversivas. Será restrita
a abordagem médica nas urgências.
O
alcoolismo é uma doença crônica. É
fundamental que se mantenha a continuidade do tratamento com
o objetivo de prevenir as recidivas.
Em
95% dos alcoolistas a abstinência é expressa como
síndrome leve a moderada. O início e o pico dos
sintomas, em geral, ocorrem em seis a oito e em 24 a 36 horas,
respectivamente após a suspensão da bebida. Nos
outros 5% dos alcoolistas, os sintomas são mais graves
e podem ser ameaçadores; geralmente atingem um pico em
96 a 120 horas, regredindo gradualmente nas 72 horas seguintes.
O delirium tremens ocorre em menos de 5% dos pacientes hospitalizados.
A taxa de mortalidade é menor que 2% em indivíduos
com síndrome de abstinência que recebem tratamento,
mas chega a 15-20% em pacientes não tratados.
Quando
é necessário o tratamento medicamentoso, os benzodiazepínicos
por apresentarem uma tolerância cruzada com o álcool,
são considerados como terapia de primeira linha no controle
de sintomas de abstinência, delirium e convulsões.
São os agentes de escolha devido a eficácia, rápido
inicio de ação e baixo custo além de viabilizar
a recomendada monoterapia nestes pacientes fisicamente comprometidos.
Considerando a farmacodinâmica da tolerância cruzada
existente entre álcool e benzodiazepínicos, pode-se
preferir os benzodiazepínicos que possuem meias-vidas
relativamente mais curtas e são convertidos em metabólitos
inativos (ex: oxazepam, lorazepam e temazepam) em pacientes
idosos ou naqueles com hepatopatias graves.
No
Brasil há disponibilidade de midazolam que tem meia vida
curta e sendo hidrossolúvel apresenta rápida absorção
IM. Torna-se portanto empiricamente a droga de escolha quando
se objetiva sedação rápida em pacientes
agitados. O lorazepam só é disponível na
forma de comprimidos, não tem metabólitos ativos,
portanto não há alteração farmacocinética
em idosos ou hepatopatas, podendo se alterar em pacientes com
insuficiência renal. É a droga de escolha em nosso
meio para uso de manutenção VO, prevenindo sintomas
de abstinência. Outra escolha na manutenção
é o clonazepam, com eficaz ação sedativa,
ansiolítica e anticonvulsivante, contudo em hepatopatas
graves pode ter aumentada sua meia vida, devendo ser usado com
moderação.
Durante
a abstinência, o paciente pode apresentar convulsões
tônico-clônicas. O uso prolongado de álcool
pode aumentar o risco de convulsões independente da abstinência.
Freqüentemente, as convulsões causadas pela abstinência
são auto-limitadas e o paciente necessita apenas de tratamento
de suporte e de manutenção com benzodiazepínicos
que apresentam ações anticonvulsivantes, relaxantes
musculares e ansiolíticas. Quando as convulsões
são recidivantes ou contínuas pode-se administrar
diazepam EV, ou midazolam EV obtendo-se boa resposta terapêutica.
A utilização de um outro agente diferente do benzodiazepínico
só está indicada, quando o paciente apresenta
epilepsia. Em pacientes não epilépticos não
há diferença significativa da fenitoína
EV em comparação ao placebo na prevenção
de convulsões induzidas pela abstinência, sendo
portanto não indicada dados os potenciais riscos da terapia
EV com fenitoína.
Estudos
tomográficos revelam em pacientes alcoolistas com convulsões
por abstinência 50% estavam normais, 34% atrofia cerebral
generalizada e apenas 15% mostraram lesões focais. Quando
há déficits neurológicos focais, 30% das
tomografias revelaram lesões focais. Portanto a tomografia
deve ser realizada apos acurado exame neurológico, notadamente
se houverem sinais de déficits neurológicos focais.
Estudos em alcoolistas crônicos com Ressonância
magnética cerebral tem revelado redução
do volume do lobo temporal às custas de lesão
em substância branca, cinzenta e hipocampo anterior, sugerindo-se
que a redução em substância branca em lobos
temporais possam ser um fator de risco ou seqüela de convulsões
relacionadas à abstinência.
Pacientes
alcoolistas atendidos em departamentos de emergência que
apresentam quadros febris, tem como causas infecciosas mais
freqüentes a pneumonia e infecções do trato
urinário. As causas não infecciosas são
delirium tremens, após convulsão prolongada e
hemorragia subaracnóidea. Causas infecciosas e não
infecciosas podem coexistir. Recomenda-se internação
a pacientes alcoolistas crônicos, desnutridos que apresentem
febre, até se identificar a causa.
Intoxicação
aguda devido ao uso do álcool - CID-10 F 10.0
A
intoxicação aguda é uma condição
transitória, resultando em perturbação
no nível de consciência, cognição,
percepção, afeto ou comportamento. Esta usual
e intimamente relacionada aos níveis de doses ingeridas.
Contudo exceções podem ocorrer em pacientes com
doenças renais ou hepáticas. Ainda o contexto
social onde se utiliza o álcool pode produzir efeitos
diferentes, extrafarmacológicos, variando da sedação
à agressividade.
Nos
PS são comuns casos de pacientes apresentando intoxicação
alcoólica aguda que passam de um estágio excitatório
para o estágio depressivo de consciência. Havendo
excitação psicomotora com liberação
de agressividade, sedação só deve ser realizada
após minucioso exame neurológico para afastar
intercorrências como hematoma subdural entre outros, já
que são freqüentes as quedas e acidentes com este
grupo de pacientes em estado de embriaguez.
Afastado
concomitante neurológico, o tratamento é sintomático:
Tratamento
da Intoxicação aguda devida ao uso do
álcool - Paciente violento
·
Paciente alcoolista crônico agitado
1.
Sedação com 1 ampola de Midazolam (Dormonid®)
3 ml= 15 mg IM, repetir a cada meia hora uma ampola
até quatro ampolas
2.
Manter uso de Lorazepam (Lorax ®) ou Clonazepam
(Rivotril ®) comprimidos de 2 mg - 1 cp 8/8 hs até
2 cps 6/6 hs dependendo do estado de excitação,
para sedar e prevenir ocorrência de sintomas de
abstinëncia, ate Delirium tremens. Reduzir 25%
da dose a cada dia, nos dias subseqüentes à
estabilização do quadro
3.
1 amp Tiamina - vitamina B1- 100 mg IM
4.
Infusão de soro se houver sinais de desidratação,
devendo ser soro glicosado se houver evidências
clínico-laboratoriais de hipoglicemia (o que
é pouco freqüente)
5.
Dramim B6 1 amp IM se apresentar vômitos
·
Paciente alcolista crônico não agitado
1. Esquema acima, exceto sedação
·
Paciente em bom estado nutricional em estado agudo de
intoxicação alcoólica ocasional
1. se agitado, sedação 2. se apresentar
vômitos, antieméticos |
Uma
critica ao uso comum de glicose hipertônica EV
São
pouco freqüentes os casos de alcoolistas agudamente intoxicados
que apresentam hipoglicemia. O uso de glicose hipertônica
em alcoolistas crônicos desnutridos (prática comum),
pode ser precipitador de grave quadro de Wernicke iatrogênico,
portanto seu uso deve ser feito somente quando houver sinais
evidentes clinico-laboratoriais de hipoglicemia, sempre preceder
infusão de tiamina, após isto infundir glicose.
- Dr.
Luís Carlos Calil*
- Prof.
da Disciplina de Psiquiatria
- da
Faculdade de Medicina
- do
Triângulo Mineiro Uberaba MG
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