Dr. Alessandro Loiola
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A depressão é uma doença extremamente comum, mas, infelizmente, cerca de dois terços dos pacientes afetados não são tratados adequadamente pois não têm a doença diagnosticada ou não conseguem ajuda médica. Os sintomas incluem distúrbios do sono, insatisfação com as atividades diárias, desânimo, dificuldade de concentração e muitos outros.
Todo mundo passa por períodos de desânimo. Os sentimentos de pesar e dor que acompanham estes períodos geralmente são necessários e transitórios, e podem até mesmo representar uma oportunidade de crescimento pessoal. Todavia, quando a depressão persiste e começa a prejudicar a vida diária, isto pode ser o indício de uma doença depressiva, e não somente um quadro passageiro de melancolia. A gravidade, a duração e a presença de outros sintomas são os fatores que distinguem a tristeza normal de um distúrbio depressivo.
A maioria das pessoas deprimidas não procura auxílio médico. Nos idosos, devido à relação complexa entre depressão, medicações e doenças graves, é especialmente importante não deixar de detectar este distúrbio. Ao contrário do que acontecia no passado, hoje a depressão é reconhecida como uma doença.
Quais são os tipos de depressão?
a) Depressão Maior: os pacientes com este tipo de depressão apresentam pelo menos 5 dos sintomas listados a seguir, por um período não inferior a duas semanas:
1. Desânimo na maioria dos dias e na maior parte do dia (em adolescentes e crianças há um predomínio da irritabilidade).
2. Falta de prazer nas atividades diárias.
3. Perda do apetite e/ou diminuição do peso.
4. Distúrbios do sono – desde insônia até sono excessivo – quase todo dia.
5. Sensação de agitação ou languidez intensa
6. Fadiga constante
7. Sentimento de culpa constante
8. Dificuldade de concentração
9. Idéias recorrentes de suicídio ou morte
Além dos critérios acima, devem ser observados outros pontos importantes: os sintomas citados anteriormente não devem estar associados a episódios maníacos (como na doença bipolar); devem comprometer atividades importantes (como o tratabalho ou os relacionamentos pessoais); não devem ser causados por drogas, álcool ou qualquer outra substância; e devem ser diferenciados de sentimentos comuns de tristeza. Geralmente, os episódios de depressão duram cerca de vinte semanas.
Os sintomas da depressão nas crianças podem ser diferentes daqueles dos adultos, incluindo tristeza persistente, incapacidade de se divertir com suas atividades favoritas, irritabilidade acentuada, queixas frequentes de problemas como dores de cabeça e cólicas abdominais, mau desempenho escolar, desânimo, concetração ruim ou alterações nos padrões de sono e de alimentação.
b) Depressão Crônica (Distimia): a depressão crônica leve, ou Distimia, caracteriza-se por vários sintomas também presentes na Depressão Maior, mas eles são menos intensos e duram muito mais tempo – pelo menos 2 anos. Os sintomas são descritos como uma “leve tristeza” que se extende na maioria das atividades.
Em geral, não se observa distúrbios no apetite ou no desejo sexual, mania, agitação ou comportamento sendentpário. Pensamentos suicidas não são comuns. Talvez devido à duração dos sintomas, os pacientes com depressão crônica não apresentam grandes alterações no humor ou nas atividades diárias, apesar de se sentirem mais desanimados e desesperançosos, e serem mais pessimistas. Os pacientes crônicos podem sofrer episódios de Depressão Maior (estes casos são conhecidos como depressão dupla).
c) Depressão Atípica: as pessoas com esta variedade geralmente comem demais, dormem muito, sentem-se muito enfadadas e apresentam um sentimento forte de rejeição.
d) Distúrbio Afetivo Sasonal (DAS): este distúrbio caracteriza-se por episódios anuais de depressão durante o outono ou o inverno, que podem desaparecer na primavera ou no verão – quando então tendem a apresentar uma fase maníaca.
Outros sintomas incluem fadiga, tendência a comer muito doce e dormir demais no inverno, mas uma minoria come menos do que o costume e sofre de insônia.
e) Tensão Pré-menstrual (TPM): há depressão acentuada, irritabilidade e tensão antes da menstruação. Afeta entre 3% e 8% das mulheres em idade fértil. O diagnóstico baseia-se na presença de pelo menos 5 dos sintomas descritos no tópico Depressão Maior na maioria dos ciclos menstruais, havendo uma piora dos sintomas cerca de uma semana antes da chegada do fluxo mentrual, melhorando logo após a passagem da menstruação.
f) Pesar: os sintomas de pesar e da depressão possuem muito em comum. Na verdade, pode ser difícil diferenciá-los. O Pesar, contudo, é considerado uma reposta emocional saudável e importante quando se lida com perdas. Normalmente é limitado.
Nas pessoas sem outros distúrbios emocionais, o sentimento de aflição dura entre três e seis meses. A pessoa passa por uma sucessão de emoções que incluem choque e negação, solidão, desespero, alienação social e raiva. O período de recuperação consome outros 3-6 meses. Após esse tempo, se o sentimento de pesar ainda é muito intenso, ele pode afetar a saúde da pessoa ou predispô-la ao desenvolvimento de uma depressão propriamente dita.
Quais são as causas da depressão?
a) Fatores Psico-sociais: as pessoas que já experimentaram períodos de depressão relatam um acontecimento estressante como o fator precipitante da doença. A perda recente de uma pessoa amada é o fato mais citado, mas todas as grandes perdas (e mesmo as pequenas) causam um certo pesar.
Acontecimentos traumáticos, como a perda súbita de um ente querido, ou mesmo eventos naturais como enchentes, podem causar uma depressão imediata, sendo necessário um longo período de recuperação. A maioria das pessoas supera este estado sem se tornar cronicamente deprimida. Alguns fatores genéticos ou biológicos podem explicar a maior vulnerabilidade de certas pessoas. A existência ou a ausência de uma forte malha social ou familiar também influenciam – positiva ou negativamente – na recuperação.
b) Fatores Biológicos: alterações nos níveis de neurotransmissores (principalmente serotonina, acetilcolina, dopamina, epinefrina e norepinefrina) relacionam-se à susceptibilidade para depressão. Alguns hormônios também podem ter um papel importante – ainda que isto não esteja muito claro. Ainda, atrofias em certas áreas do cérebro (particularmente no lobo pré-frontal) responsáveis pelo controle das emoções e produção de serotonina são responsáveis por distúrbios depressivos importantes.
c) Outras possíveis causas de depressão: medicamentos como betabloqueadores, corticosteróides, anti-histamínicos, analgésicos e anti-parkinsonianos podem causar depressão, bem como a retirada de qualquer medicação utilizada a longo prazo.
Existem fatores de risco para depressão?
Sim, existem. Qualquer pessoa que já passou por um episódio de Depressão Maior possui uma chance de 50% de apresentar outro episódio – podendo acumular 4 a 5 episódios por toda a vida. Algumas pessoas apresentam crises depressivas recorrentes separados por vários anos de sanidade mental. Outras passam por crises repetidas separadas por breves períodos normais. Infelizmente, cerca de 35% das pessoas apresentam uma depressão crônica que nunca desaparece, nem memso com o tratamento adequado.
O problema parece estar crescendo. Neste século, cada geração teve mais episódios de depressão que a anterior, e cada vez em idade mais tenra.
a) Mulheres: a correspondência de casos de depressão entre mulheres e homens é de 2:1. Não se sabe exatamente porquê isto ocorre – hereditariedade, desequilíbrios hormonais, maneira de lidar com as próprias emoções, maior facilidade em diagnosticar depressão em mulheres, pior situação sócio-econômica, abuso físico e sexual, etc.
Estima-se que uma em cada quatro mulheres apresentará um episódio de depressão ao longo de sua vida. A maioria das mulheres deprimidas encontra-se entre 25 e 40 anos, é casada e tem filhos para criar. A depressão é mais comum nos dois extremos sócio-econômicos e naquelas que fazem uso abusivo de medicamentos.
b) Crianças: acontecimentos desagradáveis na escola ou em casa podem desencadear uma crise depressiva, esta, porém, quando dura mais de duas semanas, torna-se preocupante. Crianças deprimidas tornam-se irritadiças, cansadas ou ansiosas. Podem perder o interesse em suas atividades habituais, recusar a ir para a escola ou se auto-agredir (batendo a cabeça contra a parede, por exemplo). Até mesmo crianças de 5 ou 6 anos de idade podem tentar o suicídio.
Em geral, a depressão dura cerca de 7 meses, e as chances da criança vir a apresentar um novo período depressivo são grandes. A consulta médica é imprescindível para se confirmar o diagnósitoc de depressão e, principalmente, excluir a possibilidade de outras doenças.
Algumas crianças e adolescentes podem necessitar de medicamentos antidepressivos, mas os remédios devem ser utilizados como parte de um tratamento que inclua acompanhamento psicoterápico. Entretanto, ainda existe muita controvérsia quanto ao uso de antidepressivos nesta faixa etária. Em geral, os antidepressivos tricíclicos são a primeira escolha, pois seus efeitos já são bastante conhecidos. A principal preocupação com seu uso é o risco de morte, principalmente decorrente de problemas cardíacos, que tem sido associada ao uso de desipramina (um tipo de tricíclico) em jovens hiperativos.
c) Adolescentes: muitas pessoas experimentam sua primeira grande crise de depressão durante a adolescência, ainda que não o saibam. Comumente ocorre entre os 15 e 19 anos de idade e o suicídio é sempre uma preocupação nesse grupo. Pode manifestar-se como baixa auto-estima, consumo de drogas e/ou abuso de álcool, abandono da escola, problemas com a autoridade, comportamento anti-social, pessimista, super-sensível, pouco cooperativo ou agressivo. Uma vez que estes padrões de atitude são, até certo ponto, considerados normais por nós em um adolescente, não é de se espantar que muitos casos de depressão neste grupo permaneçam não-diagnosticados e sem tratamento adequado.
Uma vez que o risco de suicídio é grande, deve-se ficar atento para alguns sinais de alarmte:
• Tentativas anteriores: os jovens que tentam suicidar-se permanecem vulneráveis por vários anos, especialmente nos primeiros três meses após a tentativa.
• Antecedentes psiquiátricos: pesquisas mostraram que o risco é maior em pacientes que já foram internados para tratamento psiquiátrico.
• Insucesso pessoal: metas muito difíceis permeadas por críticas rígidas podem desencadear uma espiral descendente que terminará no suicídio.
• Perdas recentes: a morte de um ente querido ou de um amigo, divórcio, gravidez indesejada ou o fim de um namoro podem fazer com que o adolescente se sinta tão perdido que o suicídio lhe pareça a única saída.
• Abuso de drogas: alguns adolescentes fazem uso de drogas ou álcool para escapar da depressão, mas isto pode apenas aumentar o risco de suicídio.
• Armas em casa: uma arma em casa pode facilitar o suicídio de um adolescente problemático.
• Violência familiar: a violência em casa ensina aos jovens que a maneira mais fácil de resolver qualquer conflito é através da violência.
• Falta de comunicação: a incapacidade de discutir raiva e sentimentos desconfortáveis com a família podem levar ao suicídio.
d) Idosos: este é outro grupo onde a depressão é mal interpretada. Estima-se que cerca de 20% das pessoas acima de 65 anos de idade apresentem distúrbios depressivos. Na verdade, a depressão é 4 vezes mais comum nesta faixa etária que na população em geral, e o risco de suicídio para pessoas com mais de 65 anos é 15 vezes maior.
A depressão não faz parte do envelhecimento, apesar de se acreditar justamente o contrário. Uma vez que esta doença causa dificuldade de concentração, indiferença, problemas de memória e desorientação, frequentemente ela não é percebida, sendo confundida com senilidade. Cerca de 12% dos idosos com diagnóstico de demência na verdade estão deprimidos (associações entre demência e depressão também são possíveis). Além disso, muitas das doenças que acometem os idosos podem se manifestar como depressão: doença de Parkinson, doença de Cushing, doenças da tireóide, doenças pulmonares, deficiências de vitaminas, câncer e derrame. Uma vez que o metabolismo diminui com a idade, geralmente os idosos necessitam de uma dose menor de antidepressivos para obter uma boa resposta.
Qual a gravidade da depressão?
A preocupação com o suicídio ou ameaça de suicídio, especialmente vinda de alguém sabidamente infeliz ou que tenha sofrido uma perda recente, deve ser considerada séria.
Estima-se que a depressão contribua para cerca de 50% de todos os suicídios e é uma causa importante de morte entre jovens. Na velhice, os homens respondem por cerca de 80% dos casos de suicídio – o maior risco encontra-se entre os divorciados ou viúvos.
A depressão exerce um efeito importante na piora de várias doenças e pode até mesmo predispor a pessoa a outros males. Estudos recentes indicam que a depressão pode influenciar aspectos do sistema imune, coagulação sanguínea, pressão arterial, vasos sanguíneos e ritmo cardíaco - em alguns casos, até mesmo prejudica a resposta aos medicamentos utilizados para controlar uma doença cardíaca. A saúde dos idosos deprimidos que são hospitalizados tende a piorar, e sua recuperação é mais lenta.
Existe uma forte associação entre depressão e aumento na incidência e na gravidade de derrames e ataques cardíacos. A depressão aumenta a auto-crítica e diminui o desejo sexual, além de ter um efeito direto sobre o sistema nervoso, podendo acarretar problemas de ereção. Por outro lado, disfunções eréteis podem causar depressão, e as duas condições podem terminar perpetuando-se. A pessoa deprimida possui um maior risco de alcoolismo, tabagismo e abuso de outras drogas.
Como a depressão é tratada?
A despeito da eficácia do tratamento, mais de dois terços das pessoas com depressão não serão tratados. Mesmo nos EUA, pesquisas indicam que apenas 3% dos idosos com depressão estejam sendo adequadamente tratados. Imagine no Brasil...
Algumas vezes, o distúrbio é sério o suficiente para necessitar hospitalização, mas na maioria dos casos o tratamento pode ser realizado no consultório ou ambulatório. Psiquiatras são médicos e são os únicos que podem prescrever medicamentos, mas muitos Psicólogos possuem acordos com psiquiatras para medicar seus pacientes.
A confiança do paciente em seu médico ou psicólogo é o componente mais importante do tratamento. Não se sinta embraçado em dizer ao seu analista que você não se sente à vontade com ele, e troque de profissional se não sentir-se confiante.
A maioria dos adultos necessita de antidepressivos e psicoterapia – estes variam de caso para caso. Nos casos que não conseguem sucesso com esta abordagem, a terapia com eletrochoques pode ser uma boa opção. Existe muito preconceito com respeito a esta ferramente terapêutica, mas pesquisas desenvolveram técnicas e medidas de segurança que tornaram os eletrochoques uma forma de tratamento bastante eficaz, desde que indicada apropriadamente. Os casos que não respondem ao tratamento eletroconvulsivo podem ser triados para cirurgia.
Crianças e adolescentes respondem melhor a psicoterapia que ao uso de remédios. Quando se necessita lançar mão de uma droga, os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS) são os mais indicados. Os medicamentos são mantidos inicialmente por 6 meses, quando se inicia a fase de manutenção, que pode durar um ano ou mais.
Em idosos, se dá preferência ao uso de ISRS, pois seus efeitos colaterais são menos intensos que aqueles dos tricíclicos. Contudo, devido aos benefícios ainda modestos destes medicamentos e o risco de queda, os especialistas recomendam psicoterapia para os casos leves e moderados. Idosos com depressão grave respondem melhor ao uso de antidepressivos tricíclicos – mas estes devem ser usados com cautela devido ao risco de doença cardíaca e outros efeitos indesejáveis.
Dr. Alessandro Loiola é médico, palestrante e escritor, autor de PARA ALÉM DA JUVENTUDE – GUIA PARA UMA MATURIDADE SAUDÁVEL (Ed. Leitura, 496 pág.) e VIDA E SAÚDE DA CRIANÇA (Ed. Natureza, 430 pág.). Atualmente reside e clinica em Belo Horizonte, Minas Gerais.